Investigação sobre o preço da fibra chinesa mobiliza importadores

Para a distribuidora OIW, produtores nacionais não têm escala para competir com o importado. Prysmian, Cablena e Intelbras defendem que medida traria equilíbrio a um mercado hoje inundado pela fibra chinesa e que Brasil, diferente de outros países ou regiões, está comercialmente vulnerável.

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A OIW, maior revendedora de fibra óptica importada do Brasil, emitiu um posicionamento no qual aponta para os riscos de imposição de barreiras a cabos trazidos da China como resultado de investigação atualmente em trâmite no Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).

A empresa entende que o barateamento do insumo levou a sua importação e facilitou a expansão de provedores regionais país afora. Prepara-se para enviar posicionamento à Secretaria de Comércio Exterior do MDIC para contestar a investigação aberta sobre o assunto.

“A OIW vê com preocupação o processo aberto”, diz a empresa em carta divulgada na última semana. A manifestação tem apoio da Sumec Navigator, umas das fabricantes chinesas de cabos mencionadas na investigação. Juntas, as empresas compartilharam críticas ao processo em suas redes sociais nos últimos dias.

A distribuidora defende que há uma deterioração do mercado interno de banda larga por conta da inadimplência, das taxas de juros e da inflação.

“A adoção de medidas de barreira ao mercado externo, como a sobretaxação de impostos, poderia agravar ainda mais a situação do setor, impactando a competitividade e a sobrevivência de muitos negócios, especialmente aqueles de menor porte. Além disso, representaria um grande risco ao avanço e à modernização do setor, por conta de três consequências: a elevação dos custos da fibra óptica no Brasil – prejudicando toda a cadeia produtiva até a fatura do consumidor final -, a desaceleração do avanço tecnológico nas telecomunicações e o freio à universalização da internet”, diz a OIW.

A seu ver, a investigação foi pedida por empresas que não conseguem competir com a escala das empresas chinesas. “A OIW teme pelo risco de prejuízos a todo um ecossistema e a um mercado que atende ao interior do Brasil, onde as grandes operadoras não chegam, levando conexão a comunidades das regiões mais distantes. E está empenhada em unir esforços e trabalhar ao lado das demais importadoras e fabricantes, contribuindo para a permanência das condições de competitividade deste mercado”.

A WDC, outra grande distribuidora, tem posição semelhante. “A WDC entende que a competição e os preços da fibra ótica e todos os produtos de FTTH contribuíram para a popularização da internet banda-larga no Brasil . Em relação ao processo de análise anti-dumping acredito que se analisarem os preços praticados internacionalmente pelos principais fornecedores teremos uma visão melhor sobre o assunto, e não acreditamos que exista dumping desses produtos especificamente para o Brasil.”

 

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Contexto

No pedido aceito para o início da investigação, as empresas Prysmian, Furukawa e Cablena argumentam, entre outros pontos, que há prática de dumping por parte das fabricantes chinesas. Ou seja, alegam que a fibra e cabos são feitos lá, embalados e transportados através do oceano a alto custo, mas mesmo assim chegam aqui por um preço 359% menor do que os produtos nacionais Brasil. Por isso, pedem a imposição de uma sobretaxa antidumping de US$ 9,2 mil, ou 358% a mais do que a taxa cobrada atualmente.

Segundo Marcelo Andrade, vice-presidente de telecomunicações da Prysmian para a América Latina, o baixo preço da fibra chinesa fez com que ela deixasse de não ter participação alguma no mercado local em 2014 para deter 53% das vendas hoje. Mas os números podem ser maiores, pois nem todo cabo drop é contabilizado corretamente, havendo subnotificação da fibra que entra no país para uso no varejo de banda larga.

Ele diz que foi uma decisão da União Europeia de de taxar os cabos chineses por dumping que inspirou as fabricantes locais a buscar o MDIC. A fibra chinesa, diz, é vendida aos provedores por preços até 50% mais baixos que do produto nacional.

“É um nível que a indústria nacional não suporta. Não queremos bloquear a entrada de estrangeiros. Queremos as mesmas condições de competição. Se eles construírem fábrica aqui, terão produção local e mesmos custos”, defende.

A reclamação junto ao MDIC, ressalta, se resume à fibra utilizada no varejo da banda larga. Cabos OPGW e submarinos não fazem parte da denúncia. Ele espera que em seis meses haja alguma manifestação do MDCI que aponte para o desfecho do caso. No momento, todas as empresas interessadas estão sendo chamadas a se manifestar.

Entrante nacional

A Intelbras, fabricante brasileira de equipamentos eletrônicos, acaba de entrar no mercado de fibra. Vai produzir cabos com insumos fornecidos justamente pela Prysmian. Segundo seu diretor de rede, Amilcar Scheffer, a unidade dará à empresa autonomia para a entrega de soluções de ponta a ponta. “Ao vender uma solução de vídeo-monitoramento, teremos teremos a fibra para a rede toda para oferecer”, explica.

A seu ver, o pedido por investigação deve ter efeitos positivos e trazer mais transparência à competição no mercado nacional. “Na possibilidade de haver dumping na importação de cabos, isso desregula o mercado, não faz bem para a economia e por isso a gente apoia a iniciativa”, afirma. Para a conta da empresa fechar, ele buscou a Prysmian pois com o insumo nacional consegue se beneficiar do processo produtivo básico (PPC), programa que subsidia produtos com cota mínima de conteúdo nacional.

Margens baixas

A Connectoway, distribuidora de grande porte de equipamentos para provedores e que já importou fibra, vê com outros olhos o debate. Segundo William Taylor, seu diretor comercial, a fibra chinesa entrou no Brasil porque os fabricantes nacionais partiram para a venda direta, competindo com as distribuidoras, que não tiveram saída a não ser importar.

Mas mesmo a importação não é solução para diversificar as receitas. “Saímos do segmento porque a fibra chinesa é mais barata, mas também oferece uma margem muito pequena, alguns centavos por metro. Não vale à pena pra gente”, conta. Segundo ele, a experiência com a importação também foi negativa pois a qualidade verificada dos cabos importados variava muito, ou trazia custos à revenda.

Cenário piorou

Carlos Eduardo de Oliveira, responsável pelas vendas da Cablena na América do Sul, diz que a competição chinesa ganhou contornos dramáticos nos últimos três anos, e que a tendência para 2023 é o mercado fique mais difícil para os brasileiros.

“Como houve queda na demanda por fibra na China no primeiro trimestre, na Europa há política antidumping e nos EUA também, os fabricantes trazem para cá, onde o mercado está aberto”, observa.

Ele diz que os chineses começaram a ganhar força em 2018, mas com a pandemia, inundaram o país com fibra a partir de 2020. “O período de investigação aberto vai até 2022, mas este ano piorou”, conta.

Oliveira ressalta que embora a competição seja considerada desleal, não coloca em xeque nenhuma operação de reclamantes no país, uma vez que todos têm produção diversificada. Mas alerta que a disputa tende a ficar mais acirrada também para os distribuidores, uma vez que estes vem reduzindo também suas margens. “Cada vez o preço é jogado mais pra baixo. Ninguém está fazendo dinheiro”, afirma.

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Rafael Bucco

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