Governo resiste à liberação dos recursos do FNDCT

Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados realizou audiência pública nesta sexta, 21, para debater a disponibilização dos recursos integrais do Fundo, que já foram liberados por lei.
Glauber Pimentel de Queiroz – Crédito: Divulgação

Há R$ 5,1 bilhões congelados, que seriam destinados ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) em 2021, e o governo federal não demonstra pressa em liberá-los. Por conta disso, a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados realizou audiência pública nesta sexta, 21, para debater a disponibilização dos recursos integrais do Fundo.

O deputado Nilto Tatto (PT-SP), um dos autores do requerimento, disse que a comunidade científica defende a aplicação da Lei Complementar 177/21, aprovada pelo Congresso Nacional e que recebeu dois vetos do presidente da República. Um dos vetos foi derrubado, o que mantinha a Reserva de Contingência do FNDCT. A promulgação do veto, no entanto, foi postergada e o orçamento da União para 2021 foi promulgado sem levar em consideração essa reserva de R$ 5,1 bilhões.

“Em nome da comunidade científica e tecnológica brasileira, instamos ao governo federal e aos parlamentares para que se cumpra a decisão legal, que foi tomada recentemente pelo Congresso Nacional, e sejam liberados imediatamente os recursos integrais do FNDCT em 2021”, disse Nilto Tatto, no pedido para realização da audiência pública.

Logo no início, Glauber Pimentel de Queiroz, assessor da Secretaria Especial de Fazenda do Ministério da Economia, deixou claro o posicionamento do governo em relação ao caso. “Precisamos atender setores muito relevantes e nossos recursos são escassos, mas estamos abertos ao diálogo”, falou.

A reunião virtual teve outros 11 convidados, que justificaram a necessidade de liberação dos recursos do FNDCT. “O Ministério da Economia não percebe a importância de ciência e tecnologia”, disse Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC).

“O Brasil não está jogando no time dos campeões. Não tem empresa de tecnologia entre as maiores do país, só banco”, apontou Davidovich, mostrando um gráfico representativo de sua fala.

“Não é assim lá fora. Israel tem 8.250 pesquisadores por milhão de habitantes. O Brasil tem 880. A Argentina tem 1.200”, continuou, em seu tempo na audiência. “E não adianta liberar os recursos no final do ano. Até lá já morreu o sistema nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação”, continuou.

“É quase um apagão da ciência e tecnologia brasileira”, acrescentou Valder Steffen Júnior, presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia e Empreendedorismo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).

“É até uma estratégia: quanto mais tempo levar para esse recurso ser disponibilizado, menos tempo teremos para executar algo com ele”, completou o vice-presidente de Relações Parlamentares do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), Claudio Alex Jorge da Rocha.

Inconstitucionalidade

Os convidados consideram inconstitucional a não liberação dos recursos. “A LC 177 não está sendo colocada em prática”, apontou o secretário-executivo da Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento (ICTP.br), Celso Pansera. “A LC 177 já foi aprovada. Lei é lei ou não é lei?”, questionou Fernando Peregrino, presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies). “O que defendemos aqui é o cumprimento da lei”, reforçou José Benito Abella Arritso, representante do Fórum Nacional das Entidades Representativas das Carreiras de C&T.

Não há intenção de descumprir alguma lei, afirma Glauber Pimentel de Queiroz. O representante do Ministério da Economia disse que “ainda não houve tempo de fazer essa justa adequação” e que “o remédio para isso pode ser um PL”.

“Havíamos observado uma diferença de R$ 19 bilhões principalmente concentrada em despesas obrigatórias do governo, que tiveram curva ascendente em 2020. E onde eu quero chegar com isso? O que eu quero dizer é que o cenário é muito complexo. Não somos capazes de encaminhar uma solução simplória para o caso”, disse Queiroz.

Cúpula

Celso Pansera, secretário-executivo da Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento (ICTP.br), propôs que “não se pode deixar o Ministério da Economia decidir sobre a ciência e a tecnologia”. Contou que, entre as reivindicações enviadas ao ministro Marcos Pontes, está a que pede que a decisão seja do Conselho Diretor do FNDCT.

“Paulo Guedes foi à Câmara, no início deste mês, e disse a Pontes ‘pare de fazer foguetes e faça vacinas; mandamos 5 bi para você’. Mas nada disso é verdade. O ministério não está fazendo foguete e muito menos vacina porque não tem recursos”, afirmou Pansera.

“O ataque ao FNDCT tem sido muito duro desde 2019. Tem R$ 26 bilhões ‘presos’ lá, numa conta. São 21 bi até 2020 e 5 de 2021. É necessário que o Conselho Diretor do Fundo se reúna. Marcos Pontes precisa convocar essa reunião.”

Bombardeio de questões

Durante a reunião, Fernando Peregrino, do Confies, se dirigiu a Glauber, questionando-o. “Onde estão os recursos? Há alguma dúvida do Ministério da Economia de que a ciência é uma saída para o país, não só sanitária, mas também econômica? É preciso mais evidências de que a ciência produz riqueza? O ministro não tem capacidade cognitiva de entender isso. Ou não quer entender? Ou quer jogar poeira nos olhos de todos? Ou quer fingir que não tem dinheiro? Qual investimento é melhor que C&T? O que se pretende é uma operação de desmonte da C&T brasileira? Onde está a inteligência do Ministério da Economia? Vai para o interesse nacional ou para outros interesses?”

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José Norberto Flesch

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