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Software invasor: ‘Caso First Mile não deve ser visto como algo isolado’, alerta Data Privacy

Para entidade, ferramentas de geolocalização como a que motivou investigação da PF é 'sintoma de um problema muito maior que precisa ser endereçado: a contenção do usos de softwares tecnoautoritários'
Software invasor: 'Caso First Mile não deve ser visto como algo isolado', alerta Data Privacy | Foto: Freepik
Software First Mile, usado para espionagem ilegal, motiva investigação pela PF | Foto: Freepik

A Data Privacy Brasil, entidade que reúne especialistas em proteção de dados pessoais, divulgou nota nesta sexta-feira, 20, alertando que a Operação Última Milha da Polícia Federal, deflagrada nesta manhã, mostra uma situação “gravíssima” frente ao uso indevido de softwares de geolocalização e cobra debate amplo sobre o tema.

A PF apura irregularidades no sistema de monitoramento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). A investigação aponta que, a ferramenta utilizada pelo órgão, First Mile, é intrusiva na infraestrutura crítica de telecom, e “a rede de telefonia teria sido invadida reiteradas vezes, com a utilização do serviço adquirido com recursos públicos”. Há denúncias de monitoramento de adversários políticos por meio da solução durante o governo Bolsonaro.

A Abin afirma que a aquisição do software se deu em dezembro de 2018, mas que o uso foi interrompido em maio de 2021. A agência diz ainda que vem colaborando com a PF.

Para a Data Privacy, “é preciso que o caso First Mile não seja visto como algo isolado, mas como sintoma de um problema muito maior que precisa ser endereçado: a contenção do usos de softwares tecnoautoritários que, por suas próprias capacidades tecnológicas, violam sistematicamente direitos fundamentais ao serem usados sem transparência e sem devido processo”.

No comunicado, a associação explica que “o First Mile funciona como serviço de geolocalização de dispositivos móveis em tempo real, capaz de decodificar as identidades lógicas dos dispositivos e de gerar alertas sobre a rotina de movimentação dos alvos de interesse”.

“O uso de tecnologias GLMC/SMLC para real time GPS positioning tracking for target user é uma ofensa dupla ao direito fundamental de privacidade e ao direito fundamental à proteção de dados pessoais”, diz a Data Privacy.

A entidade ressalta que a fornecedora da tecnologia, Cognyte (antiga Verint Systems), tem histórico em disponibilizar ferramentas para atividades de espionagem ilegal. Ela foi citada em apuração jornalística também em Myanmar, país do sul da Ásia continental, por oferecer serviços à empresa pública Myanman Posts and Telecommunications, em 2021, antes do golpe que resultou em mais de 12 mil prisões e 1, 6 mil pessoas assassinadas.

Desta forma, a Data Privacy Brasil defende que o Poder Público tome medidas para enfrentar o problema de forma geral. “Diante da gravidade do caso, esperamos a devida punição legal pelas condutas ilícitas do uso do First Mile para monitoramento sistemático de civis, a elaboração de novas normas jurídicas que proíbam a utilização de softwares de vigilância por geolocalização em tempo real em autorização judicial no curso de investigação criminal e processos democráticos nos quais a sociedade civil organizada, pesquisadores e especialistas possam colaborar com o redesenho do Sistema de Inteligência em perspectiva democrática”, conclui.

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