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Congresso nacional

Governo admite que modelo de autoridade de dados proposto não é o ideal, mas o possível no momento

Argumentos não convenceram os representantes da sociedade civil, que defendem um órgão independente técnico e financeiramente, nos moldes das agências reguladoras.
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O governo admitiu que a proposta da criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, como disposta na Medida Provisória 869/18, não é a ideal, mas a possível no momento. Em audiência pública na Comissão Mista que analisa a MP, o secretário de Governo Digital (Ministério da Economia), Luiz Felipe Salim Monteiro, afirmou que o modelo é transitório, mas é preciso que seja aprovado a tempo de entrar da programação orçamentária de 2020, caso contrário só terá recursos em 2021.

“O pior cenário é a não aprovação de uma autoridade de dados, que garante a eficácia da Lei Geral de Proteção de Dados. Com recursos, o próprio conselho diretor do órgão poderá propor a alteração do modelo jurídico, seja por meio de criação de autarquia ou qualquer outro, com a participação do governo”, disse Salim. Ele disse que é preciso que a aprovação do órgão seja concluída até agosto.

O subchefe adjunto para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Felipe Cascaes, disse que a Lei de Responsabilidade Fiscal impede que o governo crie um órgão que aumente as despesas, sem previsão no orçamento. Ele afirmou que o modelo proposto foi o que mais perto chegou da proposta da ANPD, prevista na Lei Geral de Proteção de Dados, mas que foi vetada por vício de iniciativa. “Caso não fosse vetada, seria derrubada por qualquer empresa punida, que recorreria ao Supremo Tribunal Federal”, disse.

Cascaes também considera que o órgão como está proposto não tem o modelo ideal e que deve ser mudado em um prazo de um ano. Ele citou o caso do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que foi criado como um apêndice do Ministério da Justiça e que depois virou autarquia e agora tem poderes ainda maiores. Mas esse processo durou anos.

Ele disse que a Autoridade não é subordinada à Presidência da República, mas parte integrante dela, e entende que a parte da independência técnica pode ser aprimorada no Congresso Nacional, exigindo, por exemplo, que a diretoria seja sabatinada no Senado. Ele ressaltou que a mudança no modelo jurídico proposto pode ser vetada pelo presidente Jair Bolsonaro. “É isso que vou recomendar”, adiantou.

Fiscalização limitada

Os argumentos dos representantes do governo não convenceram os representantes da sociedade civil, que participaram da audiência pública. A representante da Coalizão Direitos na Rede, Bia Barbosa, a falta de autonomia da autoridade de dados pode dificultar a fiscalização da aplicação da LGPD no serviço público, como mostra a prática nesse sentido. Sendo assim, vai dificultar o compartilhamento de dados com a União Europeia, que só aceita acordos com países onde a proteção de dados é eficaz.

Também pode dificultar a adesão do Brasil à OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). “Não é lógico que um órgão ligado à Presidência da República não esteja subordinado a ela”, afirmou.

É o que pensa a professora da Universidade de Brasília, Laura Schertel. Ela sustenta que o modelo proposto não é imparcial, não é independente, não conseguiu atingir um modelo que dê conta da complexidade que a lei de proteção de dados introduz. “Não vai atender a finalidade a que se destina”, lamentou.

O representante da Associação Brasileira de Marketing Direto (ABEMD) e mais oito entidades similares, Fabrício Alves, pede, do mesmo modo, que a autoridade de dados seja independente financeiramente e tecnicamente. Sem isso, acredita que o processo de normatização da aplicação da lei poderá ser prejudicado. Ele defende que sejam criadas assimetrias para pequenas e microempresas, que não podem arcar com os altos custos de aplicação da lei.

Já a representante da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Christina Dias, a proposta apresentada pelo governo traz segurança jurídica. Mas entende que esse modelo deve ser transitório. O relator da MP, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), disse que o posicionamento de Christina é diferente do estudo apresentado pela CNI, que estudou todos os modelos de autoridades de dados existentes no mundo e que defende a independência desse órgão no Brasil.

Silva disse que só uma autoridade eficiente permitirá que o Brasil tenha papel de destaque na economia digital, que é um dos mercados que mais cresce no mundo.

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