Regras ao conteúdo para crianças e adolescentes na internet avançam no Senado

Proposta dá protagonismo à ANPD como competente para definir diretrizes e dá à Justiça poder sancionador.
Regras para conteúdo direcionado a crianças e adolescentes na internet avançam no Senado
PL impõe normas para proteção de crianças e adolescentes expostos à publicidade, às redes sociais e os jogos na internet | Foto: Freepik

A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado Federal aprovou nesta quarta-feira, 14, o Projeto de Lei 2628/2022, que dispõe sobre a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais. Este é o primeiro parecer aprovado sobre a proposta, que ainda precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e a Comissão de Ciência e Tecnologia (CCT). 

O projeto, de autoria do senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), prevê regras para conteúdos direcionados especificamente a crianças e adolescentes, inclusive como publicidade e jogos. De acordo com a matéria, as diretrizes e orientações de boas práticas a serem seguidas pelas plataformas digitais seriam definidas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), 

As normas da ANPD em questão deveriam ser estabelecidas apenas após consulta ao Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e ao Comitê de Acompanhamento da Classificação Indicativa do Ministério da Justiça (CASC). 

Regras gerais

O PL 2628/2022 prevê que as aplicações de internet – assim definidos qualquer “conjunto de funcionalidades que podem ser acessadas por meio de um terminal conectado à internet” – deverão fornecer informações a pais, responsáveis, crianças e adolescentes, com acesso de forma independente à aquisição do produto, sobre os riscos e as medidas de segurança adotadas para este público, incluindo a privacidade e proteção de dados. 

A medida vale a todos os produtos ou serviços de tecnologia da informação “direcionados ou que possam ser utilizados por crianças e adolescentes”.

Conforme o texto, na hipótese de tratamento de dados de crianças e adolescentes, o controlador deverá “mapear os riscos e envidar esforços para mitigá-los”, além de elaborar relatório de impacto a ser compartilhado à ANPD.

O projeto também obriga os provedores de aplicação de internet a “garantir, por padrão, a configuração no modelo mais protetivo disponível em relação à privacidade e à proteção e privacidade de dados pessoais”, isto “desde a concepção” dos produtos e serviços, inclusive, com mecanismo de “controle parental efetivos e de simples utilização”. 

Especificamente sobre o controle parental, o projeto prevê que o Conanda e o Comitê Gestor da Internet do Brasil (CGI.br) poderão publicar diretrizes específicas. Apesar disso, os provedores também poderão submeter propostas ao Ministério da Justiça, “não sendo este um pré-requisito para disponibilização de produtos e serviços ao público”. 

Monitoramento, jogos e anúncios

O projeto de lei traz quatro capítulos dedicados a categorias específicas de conteúdo: ferramentas de monitoramento infantil, jogos eletrônicos, publicidade em meio digital e redes sociais.

Monitoramento

A proposta define como “produto ou serviço de monitoramento infantil” aqueles destinados “ao acompanhamento, por pais ou responsáveis, das ações executadas por crianças e adolescentes em ambientes digitais, a partir do registro ou da transmissão de imagens, sons, informações de localização, de atividade ou outros dados”. 

A ideia é impor que os produtos e serviços digitais desta categoria passem a utilizar mecanismos e soluções para garantir a inviolabilidade das imagens, dos sons e das outras informações captadas, armazenadas e transmitidas aos pais ou responsáveis, inclusive, com informação às crianças e aos adolescentes, “em linguagem apropriada”, acerca da realização do monitoramento.

Jogos eletrônicos

O projeto proíbe os “loot boxes” dos jogos eletrônicos, que são recompensas liberadas para aprimorar o desempenho dos jogadores frequentes por meio de bônus conquistados ou por compra direta. O autor do texto citou parecer do Conselho Federal de Psicologia, emitido em 2021, que reivindicou a proibição dos loot boxes por  considerar o mecanismo viciante e semelhante aos jogos de apostas. 

Ainda sobre jogos, o PL exige que nos casos em que há interação entre usuários por meio de mensagens de texto, áudio ou vídeo, de forma síncrona ou assíncrona, “a classificação indicativa deverá considerar a faixa etária imediatamente mais restritiva de acordo com orientações do Ministério da Justiça” e que deve ser possível desativar por meio do sistema de controle parental. 

O texto também assegura canal de denúncias na plataforma de jogos, com informação aos usuários sobre medidas prevista em caso de infrações, prazos de análise e sanções. 

Publicidade

A proposta é de que os produtos e serviços direcionados a crianças e adolescentes passem a “coibir” a publicidade. Neste sentido, ficam proibidos anúncios com os seguintes elementos, inclusive considerados abuso conforme o Código de Defesa do Consumidor:

  • linguagem infantil, efeitos especiais e excesso de cores;
  • trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas por vozes de criança;
  • representação de criança;
  • pessoas ou celebridades com apelo ao público infantil;
  • personagens ou apresentadores infantis; 
  • desenho animado ou de animação;
  • bonecos ou similares;
  • promoção com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis ou com apelos ao público infantil; 
  • promoção com competições ou jogos com apelo ao público infantil;
  • ofensa ou discriminação de gênero, orientação sexual e identidade de gênero, racial, social, política, religiosa ou de nacionalidade;
  • indução, “mesmo implicitamente, sentimento de inferioridade no adolescente, caso este não consuma determinado produto ou serviço”; ou “qualquer forma atividades ilegais, violência ou degradação do meio ambiente”;
  • ausência de “apresentação verdadeira do produto ou serviço oferecido, esclarecendo sobre suas características e funcionamento, considerando especialmente as características peculiares do público-alvo a que se destina. 

O texto também proíbe a utilização de técnicas de perfilamento para direcionamento da publicidade aos menores, bem como “o emprego de análise emocional, realidade aumentada, realidade estendida e realidade virtual” para estes fins. 

Redes sociais

O PL diz que “as plataformas de redes sociais devem monitorar e vedar, no âmbito e no limite técnico de seus serviços, conteúdos que visem à atração evidente de crianças” além de “informar de forma destacada a todos os usuários sobre a não adequação do uso dos serviços a crianças”. 

Entre os mecanismos previstos para o controle de idade está a confirmação de identidade, “inclusive por meio da apresentação de documento de identidade válido sendo os dados  coletados utilizados exclusivamente para verificação de idade”.

Punição

O descumprimento das regras pode gerar uma série de sanções, a serem aplicadas pelo Poder Judiciário. As punições são progressivas, começando com advertência e chegando à suspensão temporária de atividades da plataforma ou, nos casos mais graves, a proibição do exercício. 

Os provedores das aplicações podem ser multados em até 10% do faturamento do grupo econômico no Brasil no seu último exercício ou, se ausente o faturamento, multa de R$ 10 a  R$ 1 mil por usuário cadastrado, limitada a R$ 50 milhões, por infração. 

É sugerido que os valores das multas aplicadas sejam destinados ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos, a serem aplicados necessariamente em políticas e projetos que tenham por objetivo a proteção de crianças e adolescentes no ambiente digital.

Caso seja aprovada, a lei para conteúdo que atinge crianças e adolescentes na internet entra em vigor um ano após a publicação. 

Na CDH do Senado, o projeto recebeu parecer favorável do relator, Flávio Arns (PSB/PR), sem alterações na proposta original.  Veja a íntegra neste link

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Carolina Cruz

Repórter com trajetória em redações da Rede Globo e Grupo Cofina. Atualmente na cobertura dos Três Poderes, em Brasília, e da inovação, onde ela estiver.

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