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Qualcomm: ondas milimétricas e processamento distribuído de borda mudarão a tecnologia em 2023

Silmar Palmeira, diretor da fabricante de processadores, defende que governo recém-empossado facilite a adoção de inteligência artificial e o uso do mobiliário urbano como forma de o País fomentar a criação de cidades inteligentes
Silmar Palmeira, diretor da Qualcomm: "Ondas milimétricas trazem mais capacidade"
Silmar Palmeira, diretor sênior de produtos para Qualcomm Latam : “Ondas milimétricas trazem mais capacidade” (crédito: Divulgação/Qualcomm)

Seis meses após o início do processo gradual de ativação no País, o 5G deve abrir caminho para que diversas soluções cheguem ao mercado neste ano. Silmar Palmeira, diretor sênior de produtos para Qualcomm Latam, aponta que, entre as inovações proporcionadas pela quinta geração móvel, as ondas milimétricas e o processamento distribuído de borda devem se destacar nos próximos 12 meses.

Além disso, em entrevista ao Tele.Síntese, o executivo afirma que as aplicações com base em 5G se consolidarão mais rápido do que na geração anterior. “Aquilo que levou em torno de oito anos para acontecer com a tecnologia 4G vai acontecer em três”, reforça.

O diretor da Qualcomm defende que, para o País não ficar para trás na corrida tecnológica, o governo recém-empossado adote uma legislação que estimule o uso de Inteligência Artificial (IA). Ao mesmo tempo, derrube os obstáculos que inibem o uso do mobiliário urbano para a criação de cidades inteligentes.

“Trata-se de enxergar o grande potencial dos espaços públicos para facilitar a adoção de soluções desse tipo”, pontua.

Confira, a seguir, a entrevista.

Tele.Síntese: Em 2022, muito se falou sobre 5G, Internet das Coisas e Inteligência Artificial, além das expectativas para o metaverso. Quais as tendências de tecnologia para 2023 ou será um ano de consolidação dessas soluções?

Silmar Palmeira, diretor sênior de produtos para Qualcomm Latam: Temos praticamente seis meses desde a entrada do 5G no Brasil. Apesar de falarem que a quinta geração móvel seria só mais uma tecnologia de comunicação sem fio, a gente sempre comentou que ela seria disruptiva, porque potencializa e possibilita a utilização de outras soluções. Inteligência Artificial, por exemplo, é uma delas. Outra é a parte de processamento de borda e processamento distribuído. Uma terceira se trata de ondas milimétricas. A cabo disso vêm as redes privativas e o Open RAN.

Ou seja, o 5G, a partir do momento que é utilizado, traz novas tecnologias ou soluções, além de potencializar o uso das já existentes, como a Inteligência Artificial.

Tele.Sintese: No campo da IA, quais aplicações devem se destacar?

Palmeira: Quando a gente fala de Inteligência Artificial, a grande qualidade da foto, por exemplo, não está associada à questão do megapixel, mas sim à IA que é utilizada na solução do smartphone. A partir do momento que você tira uma foto, são várias fotos que são tiradas ali – e com a IA você faz a melhor possível.

Também ouviremos bastante ao longo deste ano sobre as câmeras [de segurança] com inteligência artificial. A tendência vai ser definir alguns padrões. Por exemplo, uma câmera filma determinada região. Define-se casos de usos e, se houver qualquer tipo de movimento, soa um alerta no smartphone.

Vai começar a ter uma adoção forte de inteligência artificial embarcada. Para as câmeras existentes, também dá para fazer uma migração rápida conectando, por exemplo, um AI box [caixa de inteligência artificial]. Em vez de ter uma inteligência artificial em cada câmera, o dispositivo funciona como se fosse um cérebro central, processando todas as imagens.

Tele.Síntese: O que podemos esperar dos processamentos de borda e distribuído a partir de agora?

Palmeira: Quando estamos conversando aqui, estamos bastante distantes um do outro, estamos usando servidores remotos. Em algumas aplicações, a latência é algo extremamente crítico, assim como a questão do recurso necessário de banda de tráfego.

Pois então, imaginemos que temos um servidor próximo ao cliente que está utilizando uma aplicação. Em vez de o tráfego estar viajando e retornando, todo o processo poderia ser feito na borda, próximo ao cliente final. Então, você teria dois benefícios. O primeiro é a experiência – pelo processamento estar mais próximo, você tem um tempo de resposta mais rápido – e outro é o custo, porque você potencializa o uso das aplicações. Então, o processamento de borda é extremamente crítico nesse caso.

A tendência, ao longo deste ano, é cada vez mais se falar em processamento distribuído e de borda para se ter eficiência de uso.

Tele.Síntese: Na prática, como isso vai funcionar com os equipamentos que temos hoje?

Palmeira: Se eu começo agora a fazer o processamento distribuído, não preciso ter tudo em um único dispositivo. Posso usar os óculos [de realidade aumentada], o smartphone e o servidor próximo para processar tudo. Então, começo a fazer com que o frame e a necessidade de bateria sejam menores. Só que, para fazer isso, precisa-se de uma IA comum em todos os dispositivos. Estamos trabalhando forte nesse processamento distribuído, que é como eu distribuo o processamento em diferentes dispositivos para conseguir ter eficiência energética.

Tele.Síntese: Você também citou as ondas milimétricas. Qual é a expectativa em torno desse compartimento do espectro?

Palmeira: No Brasil, o 5G entrou na faixa de 3,5 Ghz, mas também, como parte do leilão, teve toda a questão dos 26 GHz, as chamadas “ondas milimétricas”. Elas trazem muito mais capacidade e ultrabaixa latência comparada ao 5G que já entrou. Com as ondas milimétricas, é possível explorar um determinado serviço com alta capacidade. Em estádios, por exemplo, onde há uma alta concentração de pessoas.

Na Copa do Mundo [de 2022], torcedores no estádio apontavam o smartphone durante os jogos e, em tempo real, conseguiam receber informações sobre os jogadores. Aquilo funciona muito em cima de ondas milimétricas. Em um tempo curto, [a tecnologia] identifica o jogador e mostra a performance dele durante o jogo. Para isso ser possível, é preciso ter uma latência extremamente baixa e os servidores nas proximidades, como se fosse uma rede dedicada utilizando todo o processamento distribuído para ter acesso a essas informações.

A partir do momento que o 5G entrou corretamente no Brasil, em 3,5 GHz, já começamos a ver oportunidades ao longo de 2023 para esse tipo de aplicação em estádios, para que efetivamente, até o fim do ano, já se tenha aplicações com ondas milimétricas, a fim de explorar casos de uso de altíssima capacidade e baixa latência.

Outro ambiente no qual se pode utilizar as ondas milimétricas é na indústria. Aplicações em robôs, principalmente no setor automotivo, onde tudo é cabeado, mas, com ondas milimétricas, podem funcionar em modo wireless. O robô não pode errar ou ter um atraso na montagem de determinado carro ou peça. Com as ondas milimétricas, começa-se a ter um ambiente completamente sem fio, com a vantagem do custo mais baixo.

Tele.Síntese: Como está a iniciativa do modem FWA com a Intelbras? Vai baixar de preço?

Palmeira: A questão do FWA começou no ano passado e é muito importante. Estamos trabalhando há dois anos com o nosso parceiro, a Intelbras, na criação de um CPE [Customer Premises Equipment] de desenvolvimento nacional para, além de possibilitar uma solução de altíssima qualidade, ter baixo custo, com fabricação local. As primeiras adoções começaram em 2022, mas é ao longo de 2023 que teremos uma adesão forte. Tenho certeza de que é algo certo para acontecer neste ano.

Tele.Síntese: No início da conversa, você citou Open RAN e redes privativas. Por que são tendências fortes para 2023?

Palmeira: No mundo, quando falamos em comunicação móvel, temos poucos players. Quando você vai para o conceito de Open RAN, a ideia é trazer diversas empresas para o desenvolvimento de soluções de tecnologias. No 5G, começaremos a ter soluções no mercado que não se limitam às empresas tradicionais e aumentam a oferta de provedores de infraestrutura.

No caso das redes privativas, é interessante notar como foram reservadas frequências para elas no leilão do 5G. São 100 MHz em 3,5 GHz e 400 MHz na faixa de 26 GHz. É bastante banda. E isso dá uma flexibilidade para as empresas adotarem soluções de 5G junto com IA, processamento de borda e ondas milimétricas, sem necessariamente envolver uma operadora tradicional. A partir do momento que a frequência não está associada a uma operadora, você pode colocar a sua rede 5G com todas essas tecnologias e soluções sem depender de um terceiro, a não ser para fazer interconexão com o mundo externo.

Tele.Síntese: O Brasil ainda não tem legislação de IA, o assunto terminou o ano passado em debate no Senado. A Qualcomm tem posição sobre se e como a IA deve ser regulada?

Palmeira: Legislação e regulamentação sempre têm de ter o objetivo de facilitar e acelerar a adoção de determinada tecnologia. Ter isso como pano de fundo é o mais importante. Então, o que a Qualcomm sempre defende é que os players envolvidos na iniciativa privada e no setor público participem dessa discussão com o objetivo de facilitar a inovação, o desenvolvimento e a pesquisa e, consequentemente, a oferta de soluções de menor custo no mercado. Ou seja, regular, padronizar e legislar para se ter um arcabouço capaz de fomentar e acelerar a adoção da tecnologia, e nunca engessá-la.

Então, dizemos isso não somente no que diz respeito à AI, mas como um todo. Um país que não acelerar a adoção do 5G ou da inteligência artificial vai ficar para trás em termos de desenvolvimento.

Tele.Síntese: Novo ano e novo governo. Quais debates vocês esperam que se aprofundem em Brasília neste ano que não vinham recebendo a devida atenção no governo anterior? E o que deve ser mantido em foco?

Palmeira: Um específico é o tema do uso de espaços públicos. Falamos muito sobre o conceito de smart city, mas, para ter uma cidade inteligente, é preciso ter uma cidade conectada. Hoje, nós temos um parceiro que tem uma luminária com 5G dentro. Imagine que fosse facilitada a utilização de espaços públicos para que pudéssemos instalar esse tipo de solução, que acompanha câmera, WiFi, 5G, sensores. Trata-se de enxergar o grande potencial dos espaços públicos para facilitar a adoção de soluções desse tipo. Então, é algo para acelerar. Isso já vem sendo tratado nos últimos dois anos, mas faz parte de uma discussão maior sobre como podemos melhorar as nossas cidades, utilizando os espaços públicos em benefício da população.

Tele.Síntese: Faz seis meses que o 5G começou a ser ativado no Brasil. Qual balanço você faz da implementação da tecnologia até aqui?

Palmeira: Considerando as cinco gerações de internet sem fio, a de maior sucesso no lançamento foi o 5G, desde a forma que o leilão foi montado, por não ter uma estrutura arrecadatória e 90% [dos recursos] terem de ser revertidos para investimentos. Hoje, a velocidade de adesão ao 5G, comparada ao 4G, é pelo menos 2,5 vezes mais rápida. Aquilo que levou em torno de oito anos para acontecer com a tecnologia 4G vai acontecer em três. Então, já em 2025, a maior parte do tráfego básico vai estar em 5G. O próprio sucesso da adoção fala por si só. Além disso, há a questão das coisas conectáveis, através de câmeras, robôs, óculos de realidade aumentada e estendida. Então, teremos nos próximos três anos uma adesão muito forte ao 5G junto dessas outras soluções.

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