Yon Moreira: O novo governo pode revolucionar a sociedade pela tecnologia

Para ele, o 5G poderá "diminuir a desigualdade, diminuir os trabalhos indignos e permitir mais tempo ao lazer".
Yon Moreira acredita que novo governo pode revolucionar sociedade.Crédito-Tele.Síntese
Para o executivo, a tecnologia 5G vem para melhorar a vida das pessoas. Crédito-Tele.Síntese

O CEO da Surf Telecom, Yon Moreira, acredita que o novo governo Lula poderá promover uma revolução na sociedade brasileira, estimulando o uso da tecnologia para diminuir as barreiras sociais atuais. Para ele, o 5G poderá “diminuir a desigualdade, diminuir os trabalhos indignos e permitir mais tempo ao lazer”.

Nessa entrevista, além de falar sobre suas esperança, Moreira, que não foge a uma boa provocação, explica também porque, com uma operação móvel estável, resolveu investir em uma rede neutra fixa, abrindo mão de um naco de frequência do leilão do 5G, o que provocou a abertura de um processo de apuração na Anatel. Para Moreira, somente a rede de fibra que está construindo atenderá a todas as demandas dos novos serviços a serem lançados com o 5G.

O 5G é só mais um “G” do celular? Como avalia o ingresso dessa nova tecnologia?
Yon Moreira: O 5G vem com um propósito específico de melhorar a vida das pessoas na sociedade. Essa é a essência. Diminuir desigualdade, diminuir trabalhos indignos, permitir que as pessoas tenham mais tempo de lazer. Vamos retomar a revolução industrial:  as pessoas não tinham descanso. Aí apareceram os sindicatos, que são importantes para o equilíbrio, e veio o domingo para descansar. Depois, a produtividade do mundo aumentou, e veio o sábado para descansar. Em seguida, as 40 horas. Daqui a pouco
virá a sexta-feira de descanso.

Você acha que o 5G vai permitir isso?

Yon: O que permite isso é administrar a desigualdade e a inclusão das pessoas na sociedade. Hoje existem 150 milhões de brasileiros analfabetos funcionais, que não sabem fazer as quatro operações. Hoje, não falta só médico no interior da Amazônia, falta médico na periferia e a telemedicina está para isso. Na educação, mesmo os jovens de classe menos favorecida, têm um celular. E é uma concorrência desleal, a criança com o celular e o professor com giz e lousa. Mas o 5G permite que seja ministrada uma aula animada de física, matemática, português, história, o que quer que seja.

Quando que você acha que isso começa a acontecer, do ponto de vista de impacto social?
Yon: A minha expectativa é que aconteça nesse governo. Se eu puder esperar uma única coisa desse novo governo que se inicia, é efetivamente fazer a revolução da sociedade através da tecnologia. É a grande expectativa que eu tenho. E essas  pessoas que
já estão lá, trabalhando nessa transversalidade, têm toda a chance de fazer muita diferença no país.

O que você sugere para iniciar?
Yon: Todos os ingredientes para cozinhar o bolo estão na mesa. O leilão do 5G foi muito importante. Muito crédito para o Leonardo Euler de Morais, que no dia do aniversário do leilão, saiu da Anatel e entregou o que prometeu com muito mérito. A equipe que deu continuidade, Baigorri e superintendentes, teve um papel também importante. As operadoras também cumpriram um papel muito importante, com investimentos muito pesados, colocaram em tempo recorde o serviço do 5G à disposição da sociedade. E o ambiente criativo já esta aí: faculdades, jogos, aplicações. Ninguém tem barreiras para fazer um aplicativo de mobilidade urbana, educação, saúde. As pessoas precisam se motivar. Essas barreiras foram quebradas, mas a política de governo ajuda muito. Acredito que já há uma visão do governo, de reforçar novamente as universidades, vamos fazer com que esses núcleos de estudos possam ajudar a sociedade e as pequenas e médias empresas a desenvolverem essas aplicações. As pessoas estão ávidas, estão  esperando, a expectativa é muito grande do país se pacificar de tal forma que todos possam colher o fruto das melhorias para a sociedade.

O que você acha que seria o ponta-pé inicial ou o que falta?
Yon Moreira: Falta um plano, eu chamaria de plano inicial. Tenho a liberdade de dizer que fiz parte do grupo ” Um computador para Todos”, que foi uma parceria entre o Estado e as empresas privadas, e tive a honra de conhecer o Cezar Alvarez neste momento, e fomos padrinhos desse projeto. Para você ter uma ideia, 96% dos computadores eram contrabandeados. O governo fez uma política para que isso efetivamente tomasse outro rumo. É papel do governo definir essas políticas, mas de uma maneira rápida e efetiva. A necessidade esta posta, as soluções tecnológicas estão disponíveis, e a vontade das empresas também. É só cozinhar o bolo.

Como analisa o mercado de MVNO no Brasil, já que a Surf é uma das maiores habilitadores desse tipo de operador de celular? Acha que precisa mudar alguma coisa na regulação?
Yon: Acho que não. Toda regulação tem que se aperfeiçoar, mas diferente de serviços mais corriqueiros, o serviço essencial é de muita responsabilidade. Tanto o serviço financeiro quanto o de telecomunicações são serviços regulados que têm um objetivo definitivo, de garantir  serviço prestado ao consumidor. O banco, no dia seguinte, tem que ter o dinheiro na conta corrente do sujeito, e agora, instantaneamente, como PIX. O celular, tem que funcionar na hora que o cliente quiser. Então, a regulação mais restrita não deixa de ser uma peneira para tirar os aventureiros.

Falando em celular, como anda o processo da Neko, em relação à devolução da frequência de 26 GHz?

Yon: Estamos nas etapas técnicas quanto ao pedido de reconsideração em relação à execução das garantias. 

Como você analisa hoje o cenário competitivo do setor no Brasil?

Yon Moreira: É um setor de capital efetivamente intensivo. Entendo que hoje as  OTTs são, de fato, as grandes empresas que chamamos de “telecomunicações”. No Brasil e no mundo. São a AWS, Google, Meta, e por aí vai.  Essas empresas são provedores de infraestrutura.
Tenho muita expectativa de que os órgãos reguladores continuem a fomentar a concorrência de uma maneira inteligente, não forçando a barra, mas criando novos meios. O Banco Central é um ótimo exemplo de como criar concorrência, mas jogando o jogo do futuro. Vejo também a Anatel com um papel fundamental nessa política da transformação digital, mas ela tem que se propor a esse papel.

Por quê a Surf Tech decidiu partir para a construção de uma rede fixa, e firmou parceria com a Rumo, de ferrovias?

Yon: O que você precisa de uma rede de fibra óptica? Resiliência e capacidade. O  SLA [ tempo de funcionamento do serviço] de uma rede aérea, como essa que a gente tem em casa, fica fora dias ou semanas todos os anos. As redes de fibra ópticas urbanas ficam fora somente por dias. E as redes de fibra óptica instaladas nas rodovias e ferrovias e os cabos submarinos ficam fora somente por horas. Essas últimas têm muita resiliência. As redes que estamos investindo tem a latência muito baixa, de quatro ou cinco milissegundos, que permite os serviços do 5G. Não existe rede hoje no país com essa capacidade. 

Você acha que há espaço para mais uma rede neutra, para oferta de atacado, no país?

Yon: Mas não tem outra!

Por que você acha que vai ser diferente das demais?
Yon: Não existe hoje qualquer rede que tem um backhaul cobrindo 80% do tráfego no país, de alta capacidade. Não existe. E a nossa está aí para isso. 

E em relação à rede neutra na frequência de 700 MHz?

Yon Moreira: Rede neutra em 4G? Para mim, é um Chevette zero quilômetros… 

 

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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