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Dilema da Oi: ser operadora só de fibra ou manter o móvel?

Operadora vai precisar de mais capital para ampliar cobertura com FTTH e competir com os ISPs. Também pode vender braço móvel ou, se o mantiver, terá de obter dinheiro para participar do próximo leilão da Anatel, em março de 2020.

O futuro da operadora Oi no Brasil, imersa a uma recuperação judicial que completou três anos em junho, depende de inúmeros fatores que fogem ao controle da companhia, mas que podem ser equacionados com mais dinheiro além do aporte de R$ 4 bilhões já feito pelos atuais acionistas. Analistas do mercado de telecomunicações ouvidos pelo Tele.Síntese apontam que há diferentes saídas para a empresa, mas sempre há necessidade de injeção de capital na expansão ou melhoria da rede de fibra.

Para Ari Lopes, da consultoria Ovum, o futuro da Oi deverá ser selado em definitivo com o leilão de frequências 5G, previsto para acontecer em março de 2020. Na licitação, haverá um lote de 700 MHz que apenas a Oi poderá arrematar. Preços e condições ainda são desconhecidos. Mas caso o valor seja de mais de R$ 1,5 bilhão, como foi no último leilão do tipo, já será mais difícil a entrada da empresa na disputa por outras bandas, como a de 3,5 GHz, que será usada na 5G.

“A Oi teria que fazer o investimento no espectro e em toda a infraestrutura necessária para aproveitar essas novas frequências, e para manter um market share que é o menor do mercado, de 16%. Por isso acho difícil um cenário para a Oi em que manter o celular vale a pena”, diz.

A seu ver, os rumores no mercado de que a Oi estuda vender seus ativos de operadora móvel fazem sentido na medida em que ela não conseguirá manter o mesmo Capex que as concorrentes para manter o nível de serviço. A melhor alternativa, diz, seria focar no atacado, FTTH e atendimento corporativo com banda larga.

“Ela tem o maior backbone de fibra no Brasil. Investe R$ 7 bilhões por ano, boa parte foi em fibra. Em um ano, aumentou em 4x a base de FTTH. Como tem capilaridade grande de rede, baseou o investimento em reusar o backbone. Uma Oi capitalizada vai permitir uma competição capilarizada para fazer frente ao avanço dos ISPs. Se conseguir colocar mais dinheiro ali, tem chance de um retorno melhor do que investindo no móvel”, analisa Lopes.

Lopes também acredita que o momento de vender é agora. “Deve ser uma última oportunidade para que um novo player entre no mercado latino americano. A China Mobile abriu escritório no Brasil, pode ser um comprador. Ou a venda pode acontecer por regiões do Brasil. Por conta da recuperação judicial, o preço dos ativos está relativamente baixo”, especula.

Sem móvel, recuperação é mais difícil

Para Eduardo Tude, da consultoria Teleco, a Oi deve manter a operação móvel para não perder diferenciais onde a competição é mais intensa. A operadora, diz, tem muitos ativos para vender e fazer caixa antes de colocar em oferta sua área de mobilidade.

“Ela precisa de muito dinheiro para investir em fibra e em móvel. Vai ter a licitação no início de 2020 em que a Oi precisa comprar os 700 MHz e alguma frequência de 5G, e os executivos vão precisar encontrar uma equação para isso. Mas, sem o móvel, a operadora iria encolher muito”, diz.

Conforme os dados mais recentes da Anatel sobre o mercado de telefonia móvel, a Oi cresceu no market share do pré-pago e no pós-pago. Continua a ser a quarta operadora em quantidade de assinantes, mas demonstra fôlego no celular.

“O setor em que ela tem mais dificuldade é na telefonia fixa, que está encolhendo e vai continuar, mas ainda é expressivo em receita. O jeito é compensar na banda larga, mas a dificuldade também está grande [em função da competição com ISPs]. No móvel, a operadora está começando a se equilibrar, embora mais tarde que as concorrentes. Sem o móvel, a empresa perderia a forte sinergia existente entre a rede de fibra e a infraestrutura de wireless”, analisa Tude.

A dificuldade seria obter capital para o leilão. Como a tele ainda está em recuperação judicial, tem dificuldade em obter crédito. “Por isso ela precisa sair da RJ, ou os sócios terão de equacionar. Ou terá de negociar com a Anatel o pagamento parcelado das outorgas”, diz.

Dívida crescente

A agência de risco Fitch publicou no final de junho uma análise sobre a situação financeira da operadora. No material, lista os desafios e fortalezas da tele. Diz que Oi deve continuar a queimar caixa pelo menos até 2021. A guinada da operadora rumo ao crescimento só será de fato confirmada em 2023, quando começa a amortização do principal da dívida que restou da recuperação judicial.

O desafio é conseguir transformar os investimentos em crescimento da base de clientes até lá. Neste sentido, há o risco de a operadora iniciar uma guerra de preços para garantir mercado, achatando ainda mais as receitas. No móvel, os resultados recentes foram um alento, com redução do ritmo de perda de clientes e expansão de 20% no pós-pago no primeiro trimestre.

A agência lembra que a Oi não recebeu apenas o aporte de R$ 4 bilhões e diminuiu sua dívida total, mas deve receber R$ 2,6 bilhões em dividendos da Unitel. A Fitch acredita também na venda de ativos não estratégicos. O problema é que o caixa continuará a encolher e o endividamento, mesmo reestruturado, a crescer.

Para a Fitch, as receitas vão diminuir ainda ao longo de 2019 e só vão se estabilizar ano que vem, para depoise em um crescimento baixo — mantido o cenário macroeconômico. A agência de risco calcula que em 2021 a Oi terá receita total de R$ 21,1 bilhões, maior que em 2019 (R$ 20,9 bilhões) e 2020 (R$ 20,7 bilhões), mas menor que a de 2018 (R$ 22 bilhões). Enquanto a dívida líquida deve subir de R$ 24 bilhões para R$ 31 bilhões até 2021.

Essas condições impediram a Fitch de melhorar o rating da companhia, que foi mantido no mesmo patamar de 2018, em B-. Esta nota significa que há necessidade de venda de ativos para garantir flexibilidade financeira, fluxo de caixa negativo, os títulos são arriscados, mas há confiança de que serão pagos, e a estratégia é desafiadora, mas possível.

 

(O título desta reportagem foi alterado após a publicação)

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