Relator da Anatel do acordo Winity/Vivo busca “conciliar posição”

O fim do sigilo dos dois pareceres contrários ao acordo entre a Winity e a Vivo de ran sharing da faixa de 700 MHz esquentou ainda mais o debate entre os diferentes atores do mercado
Relator do acordo Winity Vivo busca conciliar posiçãoDivulgação
Alexandre Freire estuda “remédios” para viabilizar o negócio. Divulgação

O fim do sigilo dos dois pareceres contrários ao acordo entre a Winity e a Vivo de ran sharing da faixa de 700 MHz esquentou ainda mais o debate entre os atores do mercado não por causa dos documentos em si, sobre os quais muito já se conhecia, mas principalmente devido à posição explicitada pelo relator do processo, o conselheiro Alexandre Freire, ao se manifestar pela liberação de documentação.

Ele afirma que, com essa iniciativa, espera que todos os envolvidos busquem uma solução conciliada, sob a supervisão da Anatel. Para diferentes interlocutores do mercado e da própria agência que acreditam que esse acordo não pode prosperar, não haveria como buscar uma solução conciliadora para um acordo no qual já há manifestação contrária das duas vozes mais eloquentes da agência – a técnica e a jurídica –

O conselheiro Freire tem buscado diferentes “remédios” que, em sua avaliação, poderiam ser aplicados no sentido de mitigar os problemas levantados internamente para dar continuidade ao acordo. A tentativa de salvar o acordo teria também o apoio de mais um conselheiro da Anatel. Mas, até o momento, os remédios sugeridos, na opinião de outros dirigentes, poderiam fazer mais mal do que a vedação pura e simples da proposta em análise.

As vozes discordantes

Para os agentes do mercado que são contrários à proposta, os vícios  do acordo começam desde sua origem. Isso porque, alegam, a intenção da Anatel desde que formatou o edital de licitação foi a de fortalecer a competição no segmento de telefonia móvel, após a saída da Oi Móvel, e por isso promoveu a venda da faixa de 700 MHz em um único lote nacional, de maneira a viabilizar um fornecedor de atacado, ou uma “rede neutra” de espectro.

A compra da frequência pelo grupo Pátria, que ofereceu ágio de mais de 800% ao preço mínimo, foi entendida, inicialmente, como o fortalecimento dessa proposta.

Embora os interlocutores reconheçam que nem o edital nem a Anatel poderiam “escolher” as empresas que iriam compartilhar a frequência adquirida, o fato de o acordo da Winity com a Telefônica Vivo prever ocupação de metade do espectro comprado, sob a forma de exclusividade, que atinge a maioria das cidades com mais de 30 mil habitantes (as mais viáveis) e que ainda pode induzir a uma venda casada das torres, causou a consternação das operadoras regionais que compraram as faixas do 5G e sabem que sem a faixa de 700 MHz terão muito mais dificuldades em viabilizar seu ingresso no mercado. E por isso enxergam o acordo anunciado como a antítese da iniciativa regulatória. Entram também nesse debate as empresas de torres.

Ponto a ponto

Os provedores regionais apresentam os contra-argumentos àqueles que buscam viabilizar o acordo. Para os interlocutores regionais, não é possível, por exemplo, alegar que a Vivo irá ocupar apenas o espectro em caráter secundário, e que, assim, não estaria descumprindo as limitações de teto máximo de frequências. “ Ora, se a Vivo ocupará em caráter secundário a faixa de 700 MHz da Winity, qual a empresa que ocupará em caráter primário? Quando essa empresa inicia a prestação do serviço?”, indaga um executivo.

Outra questão difícil de entender, dizem os operadores regionais, trata-se do próprio contrato de ran sharing.

“ Existem atualmente três modelos de ran sharing sendo praticados: quando há muito tráfego de dados, as empresas que têm espectro compartilham a torre, mas colocam cada uma seu rádio próprio em seu espectro outorgado. Há ainda os modelos para pouco tráfego, que podem ser as empresas compartilhando o rádio em uma única frequência ou ainda colocando cada uma o rádio em uma única frequência, mas dividindo a ocupação por número de cidades a serem atendidas. No caso do acordo, para ter o “ran” é preciso ter o “sharing”. E qual é a frequência que Vivo está oferecendo para ser compartilhada?”, indaga outro interlocutor.

Para prevalecer a determinação do edital, diz um interlocutor, a Winity, que é a dona do espectro, teria que instalar o rádio e oferecer essa capacidade de transmissão para o mercado. “Aí qualquer operadora interessada alugaria, compraria, faria qualquer coisa e colocaria essa capacidade em sua rede. Do jeito que está isso não pode ocorrer”.

Quanto ao argumento já apresentado pela Winity de que sem o acordo com a Vivo, não conseguirá cumprir as pesadas obrigações do edital, e que os preços que  provedores regionais querem pagar são muito baixos, inviabilizando o modelo de negócios, esses interlocutores indagam: “ O fundo Pátria certamente fez as contas. E se ofereceu um bilhão a mais pela frequência, é porque sabia onde estava pisando….”

TCU

A intenção do Tribunal de Contas da União (TCU) de pedir explicação ex-ante à Anatel sobre o acordo da Winity com a operadora causou grande desconforto na agência, pois não é assim que a relação institucional entre os dois agentes de Estado acontece. Afinal, Anatel decide, e TCU julga decisão, podendo até mandar refazê-la. Mas acompanhar preventivamente, é iniciativa inovadora.

Mas um argumento foi importante para acalmar o ânimo na Anatel. O fato de que, como o leilão do 5G foi não arrecadatório, a lupa do TCU tornou-se mais ativa.  A Anatel deverá responder aos questionamentos do tribunal ainda esta semana.

Cade

Hoje, representantes das operadoras de pequeno porte também estiveram no Cade, mas, para eles, muitos dos temas em debate (ran sharing, exploração industrial de espectro, uso secundário de espectro) são mesmo da esfera da agência reguladora.

 

 

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Miriam Aquino

Jornalista há mais de 30 anos, é diretora da Momento Editorial e responsável pela sucursal de Brasília. Especializou-se nas áreas de telecomunicações e de Tecnologia da Informação, e tem ampla experiência no acompanhamento de políticas públicas e dos assuntos regulatórios.
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