Atendimento virtual ganha espaço

Os atendentes virtuais inteligentes começam a fazer parte de diferentes canais de atendimento, em projetos pontuais ou plataformas mais poderosas. Mas o caminho para plena adoção das tecnologias de IA e aprendizado de máquina é árduo.

O Tele.Síntese está publicando periodicamente os textos do Anuário Tele.Síntese de Inovação 2018, publicado pela Momento Editorial no último trimestre do ano. Confirma, abaixo, mais uma das reportagens sobre os rumos das inovações no setor de telecomunicações.

Atendimento virtual ganha espaço

O uso de assistentes virtuais inteligentes é uma tendência que vem crescendo entre as empresas interessadas em tornar o relacionamento com seus clientes, por diversos canais de comunicação,
mais natural, eficiente e humano. Cerca de cem milhões de assistentes inteligentes serão vendidos em todo o mundo até o final de 2018, segundo estima a Canlys, empresa norte-americana
de pesquisa de mercado. Nos Estados Unidos, esse negócio tem sido dominado pelo duopólio Amazon e Google. O rival mais próximo é a Apple, com seu HomePod, que detém 1% do mercado.

As operadoras estão investindo pesado em ferramentas sofisticadas e equipes dedicadas para cuidar dos aplicativos e chatbots (assistentes virtuais) de forma a estar onde o cliente se encontra.
A Aura, plataforma mundial de Inteligência Artificial da Telefónica lançada neste ano globalmente, graças à aplicação de capacidades cognitivas, servirá de base para um novo modelo de relacionamento com os clientes da Vivo. “A Aura é mais do que um canal. É a quarta plataforma baseada em tecnologia de ponta, Inteligência Artificial e big data. Trata-se de um processo para tornar tudo mais fácil”, afirma Luiz Medici, diretor de Big Data e Quarta Plataforma da Vivo. A solução, que começou a ser desenvolvida na plataforma do Meu Vivo, já foi testada com cem mil clientes no Brasil, 80% dos quais interagiram positivamente com a ferramenta.

Com um programa muito menos ambicioso, a Oi, como parte de seu programa de transformação digital, lançou, também durante o mês de fevereiro deste ano, um assistente virtual que interage com os clientes em linguagem natural, identificando suas necessidades e provendo serviços para resolução de suas demandas do dia a dia. Numa primeira fase, o assistente pessoal foi criado para interagir via chat fornecendo informações para pagamento das contas (código de barras, valor e vencimento) dos produtos Fixo, Banda Larga, Pós e Oi Total. A solução utiliza o IBM Watson (plataforma de Inteligência Artificial na nuvem) e, progressivamente, seria adotada em novos canais como Facebook Messenger, Google RCS.

A Claro Brasil, relata Rodrigo Duclos, Chief Digital Officer da empresa, vem desenvolvendo projetos com o uso de Inteligência Artificial desde meados do ano passado, como o atendimento via
bot no Facebook e soluções de venda por bot nas lojas online da Claro, NET e Embratel. “Agora estamos com um grande investimento para consolidar o uso de IA para o autoatendimento via chat
pelo site e redes sociais (Facebook)”, diz. Na NET, o foco é usar IA para o atendimento financeiro aos clientes no site (solicitação de segunda via de conta e alteração da data do vencimento da fatura) e para oferecer suporte técnico. E na Claro, até o final do ano, vai ser lançado o atendimento técnico com auxílio de IA para clientes residenciais.

Também a TIM Brasil começa a desbravar caminho semelhante para melhorar a experiência do cliente no relacionamento com a empresa. Segundo sua assessoria, já trabalha com reconhecimento
de voz com IA no seu atendimento pela URA e no chat e, em breve, terá um bot no Messenger. De acordo com a previsão do Gartner, 25% dos processos recém-automatizados das operadoras de
serviços de comunicações utilizarão tecnologia de aprendizagem de máquina. Para Charlotte Patrick, diretora de pesquisa do Gartner, os assistentes especializados cognitivos demoram a dar resultados, mas oferecem um sólido retorno do investimento. Na sua opinião, a automação inteligente de processos ainda requer anos de desenvolvimento para que muitas barreiras sejam superadas.

Por conta de fraudes e investigações do uso de cartões de crédito, o setor financeiro é o que mais investe em soluções de IA e aprendizagem de máquina no país. Em seguida estão as áreas de
telecomunicações, na prevenção de churn e fidelização de clientes; comércio, para recomendação e aconselhamento de produtos e serviços; e saúde, na detenção de fraude em seguradora, triagens
em função de fichas de pacientes, sistemas de apoio a diagnóstico e tratamento.

Falta capital de risco

Como o acesso à tecnologia tem se tornado globalizado e horizontal, o que diferencia o Brasil dos demais países nessas áreas é a quantidade de dinheiro disponível para investir em inovação. “Falta capital de alto risco”, frisa Carolina Bigonha, cofundadora e diretora de impacto da Hekima, empresa mineira especializada em soluções de IA, alinhadas aos objetivos sustentáveis da ONU (ODS). Em termos de mercado, os Estados Unidos encontram-se mais maduros, pois contam com muitas empresas, soluções e consumidores. No Brasil, há muitas experiências em grandes empresas. E surgem algumas iniciativas estruturadas de fornecedores de soluções e startups, especialmente nas cidades de Belo Horizonte, Recife e São Paulo.

O mercado brasileiro tem uma série de peculiaridades e para que as soluções de IA e aprendizagem de máquina sejam mais eficazes e eficientes é necessário que desenvolvedores e técnicos entendam bem o contexto. “Nossa restrição não está na infraestrutura, mas em quem desenvolve a solução. Especialistas são pagos a preço de ouro, porque o Brasil não tem recursos do lado de TI que entendam bem essa área”, observa Delai. Segundo ele, estamos formando profissionais, mas existe um delta grande até que comecem a dar retorno.

A Inteligência Artificial permite fazer modelagens de previsões de eventos externos, rota de fuga em desastres ambientais, entre outros, identificando padrões por meio de algoritmos.
O algoritmo tradicional é fácil de escrever. Mas, em se tratando de aprendizagem de máquina, a coisa muda de figura. É preciso ensinar ao computador a identificar, por exemplo, a foto de um
carro, um cachorro e uma pessoa. Não existe referência como ponto de partida. A única forma é dar exemplos de fotos, categorias, imagens para que o computador absorva as informações, por repetição, crie repertório de forma a gerar os algoritmos e, então, produzir a modelagem. “A margem de erro de uma solução de ML em geral é de 20%. Porém, quanto mais crítico for o algoritmo, maior o envolvimento humano na decisão final. O médico não vai fazer uma cirurgia só porque o algoritmo diz que é necessário”, explica Bigonha.

A preparação dos dados é considerada a fase mais complexa para o desenvolvimento de uma solução de Inteligência Artificial. Em geral, são armazenados pelas empresas em silos e encontram-se
quase sempre incorretos, com cadastros errados. Portanto, é preciso tratá-los, pois sua precisão conta para o sucesso das ferramentas desenvolvidas. Desde 2011, a Watson da IBM, uma das primeiras plataformas de serviços cognitivos para negócios e uma no desenvolvimento do idioma português, mostra ao mercado sua maturidade para tratar dados não estruturados. “Em vez de desenvolver um programa tradicional para ver se tem saldo em uma conta bancária, o desafio hoje é criar soluções para responder com assertividade quando o cliente pergunta: Tem fundo na minha conta?”, explica Alexandre Dietrich, executivo de Watson AI & Data IBM Brasil. Segundo ele, cerca de 87% dessa conversa é intenção, traz conhecimento de linguagem virtual e machine learning para construir o assistente virtual.

Diferente do ERP, a tecnologia de machine learning é modular e permite começar pequeno e ir evoluindo a partir das necessidades. É o caso da Bia, assistente virtual do Bradesco, desenvolvida
pela plataforma Watson. Foi criada com a missão de entender e resolver o problema do cliente. Seu primeiro desafio foi dar suporte aos gerentes do banco que não conheciam em detalhes alguns
produtos e serviços, o que acabava impactando no tempo de resposta ao cliente, que esperava em torno de dez minutos pela informação correta.

Além de aprender tudo sobre os produtos, serviços e políticas do banco, Bia extraiu o máximo das conversas trocadas entre os gerentes, atingindo 85% de acuracidade nas respostas, tirando  dúvidas de 65 mil colaboradores. Atualmente, ganhou a preferência do cliente final, com 95% de respostas precisas, mas que dificilmente chegarão a 100%. Afinal, ela está em constante aprendizado, pois sempre haverá novas dúvidas de clientes e produtos.

Efeito IoT

A previsão para os próximos dois anos é de crescimento exponencial para Inteligência Artificial e machine learning, a partir da expansão do uso da tecnologia de Internet das Coisas (IoT), que vai gerar mais informação. Conforme os dados do IDC Brasil, IoT representava menos de 2% do volume de informação gerada no mundo em 2013. A expectativa é que chegue a 10% em 2020. “Os sistemas tradicionais não serão capazes de processar e interpretar essa massa de dados. Serão necessários recursos de IA”, afirma Thiago Rotta, diretor de Inovação da Microsoft Brasil.

A Microsoft está insistindo na criação de uma plataforma global aberta e de uso gratuito, que incorpora recursos de IA. A plataforma é mais voltada para serviços cognitivos e processamento de
linguagem natural que para resolver problemas complexos de big data, além de tornar cada usuário capaz de lidar com a tecnologia de forma ágil e de baixo custo. “Estamos investindo muito na
quantidade de dados e treinamento”, diz Rotta. Em se tratando de Aprendizagem de Máquina, o investimento em treinamento é cerca de 80% maior do que o desenvolvimento da solução propriamente dito, que chega a 20%.

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Vera Franco

Jornalista com atuação em tecnologia e negócios e experiência internacional como correspondente baseada em New York para jornais e revistas da grande imprensa e da mídia especializada. Formada pela PUC/ RJ, com especialização em Stanford University e MBA em Marketing ESPM/SP

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